d.e.s.p.e.r.t.a.r
Significado: sair do estado de torpor ou de inércia; readquirir força ou atividade.
Entorpecida. Presa a decepções do passado, diante de desafios que eu não sabia mais como lidar e escrava de padrões sem fundamento. Sem propósito. Era assim que eu estava antes de despertar.
Tudo começou mais ou menos como aconteceu com a Alice, no País das Maravilhas, certo dia alguém passou e chamou a minha atenção. Eu mergulhei sem pensar atrás dele, e fui projetada para um novo mundo, que confrontou tudo o que eu tinha aprendido até então e me transformou.
Durante essa jornada de descobertas, um elemento reapareceu na minha vida, a escrita, dando sinais concretos de que uma mudança estava prestes a acontecer e me ajudando a lidar com tudo isso na prática.
Esse foi o primeiro texto que escrevi, depois de anos:
`A liberdade de ser
Eu não sei lidar com a liberdade. A que está dentro de mim, sim. As vezes chego a ter inveja dela, que é tão livre, tão ousada.
Já tivemos discussões importantes porque por vezes ela queria tomar o meu lugar, ser ela e eu. Ou ser só ela. Não deixei, claro. Tem muita coisa aqui de fora que ela não sabe.
Se ela quer chorar, chora. Se quer rir alto, ri. Se quer desistir, desiste. Se quer recomeçar, recomeça. Se quer abraçar, abraça. Se errar, errou. Se amar, amou. Ela não quer impressionar ou provar nada para ninguém. Ela não quer vestir 36, ser poliglota, sair na capa da Forbes. Ela ainda fecha acordos com palavras, acredita no outro. É positiva, não vê o mal. Não tem medo. Ela sonha alto, não sabe ser contida. Ela simplesmente é o que é e tem orgulho disso. Como vou deixar alguém assim sair?
Estamos sem nos falar agora, depois da nossa última conversa. Tomei um pouco de distância para tentar entender tudo o que falamos, porque fiquei na dúvida se é ela quem não sabe as coisas aqui de fora ou eu quem não sei as coisas de dentro.
De uns tempos para cá ela passou a me abordar com muita intensidade, querendo ganhar mais espaço porque já não cabia onde estava.
Disse que ela é quem conhece a verdade e que eu estava cercada por mentiras. Me perguntou de que adiantava acordar pela manhã todos os dias, deixar os sonhos na cama e vestir a roupa de viver, citando a poeta Clarice Lispector. Ela tem dessas, gosta de poesia.
Falou ainda que eu não era fiel a mim mesma, que me julgava sem dó e não me perdoava. Que não entendia porque eu dizia sim quando queria dizer não e vice-versa. Por que eu estava sempre correndo atrás do vento, até cansar. E por que tinha que ter sempre respostas para tudo.
Me perguntou se eu achava fácil ser ela, que encarava de frente cada emoção. E se eu sabia que as vezes doía, as vezes assustava, as vezes não, mas que isso era estar viva. Isso era ser a todo momento surpreendida pela alegria de ser quem é. Isso era ter propósito.
Ainda não contei para ela, mas cheguei a minha conclusão. De que vale saber das coisas de fora quando as de dentro não estão no coração? Tomei a decisão de deixá-la na liderança agora, só pedi para ela me dar a mão. Já sinto o vento no rosto, os cabelos sem direção. Acho que meus sentidos estão aguçados, estou ouvindo a minha respiração. Nunca tinha reparado em tantos tons de cores juntos, isso é uma aquarela ou o quê? E esse cheiro inebriante? Parece que se chama dama da noite e floresce no verão.
Já não sei mais se sou eu, ela ou se somos nós. Mas aprendi que só o que importa é ter a liberdade de SER.`
Por trás da inércia da superfície, tinha muita coisa acontecendo no coração, como podemos ver.
Quem encontrei no caminho? Meu Criador, e despertei para uma vida com propósito.
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Ilustração feita pela Kéllen, @kv_ilustra